A dança, em sua essência, é uma linguagem universal que transcende fronteiras. No Brasil e nos Estados Unidos, dois coreógrafos com trajetórias distintas, Zebrinha e Marissa Molinar, exemplificam como o movimento pode ser uma poderosa ferramenta para a formação de novos artistas, a preservação da cultura e o ativismo social. Enquanto um se destaca no horário nobre da televisão brasileira, a outra constrói uma comunidade engajada em Boston, provando que o impacto da dança vai muito além do palco.
Zebrinha: O Legado da Dança Afro-Brasileira no Horário Nobre
O coreógrafo baiano José Carlos Arandiba, mais conhecido como Zebrinha, tornou-se uma figura de destaque na nova temporada da “Dança dos Famosos”, quadro do programa “Domingão com Huck” da Rede Globo. Ao lado de Ana Botafogo e Carlinhos de Jesus, ele compõe o júri técnico fixo, onde suas avaliações têm emocionado tanto os participantes quanto o público.
A sua presença foi celebrada por artistas como a atriz Jéssica Ellen, que destacou a importância do coreógrafo. “Zebra é um cara fundamental para a dança brasileira, para a dança afro, para a dança moderna e muita gente não sabe disso”, afirmou. O ator Sérgio Menezes também fez questão de exaltar o legado de Zebrinha, que já coreografou produções da Globo como “Lado a Lado” (2012) e “Mr. Brau” (2015).
Com mais de 40 anos de carreira, Zebrinha iniciou sua jornada aos 17 anos em um grupo folclórico em Salvador. Seu talento o levou a estudar na Escola de Forma e Movimento de Carmen Paternostro e a integrar o Grupo de Dança Contemporânea da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Sua trajetória inclui especializações na Holanda, Suécia, França e Estados Unidos, além de trabalhos com estrelas internacionais como Liza Minnelli e Tina Turner. Atualmente, Zebrinha é diretor artístico do Balé Folclórico da Bahia e, há 30 anos, coordena o Bando de Teatro Olodum, onde participou da criação de espetáculos icônicos como “Ó, Pai, Ó” e “Cabaré da RRRRRaça”.
Marissa Molinar: Movimento e Liderança em Boston
A milhares de quilômetros de distância, em Somerville, Massachusetts, a dançarina e ativista Marissa Molinar lidera um movimento semelhante de transformação. Em um estúdio com um leve aroma de chocolate vindo de uma fábrica próxima, dançarinos se dedicam a aulas de improvisação que vão além da técnica. As aulas de Molinar ensinam autoconsciência e o equilíbrio entre a liberdade de expressão e a tomada de decisões instantâneas.
Essas habilidades são o foco do MIDDAY Movement Series, um programa fundado por Molinar há 10 anos, dedicado a formar e apoiar dançarinos profissionais em Boston. Ela descreve a iniciativa como “um projeto de base que cultiva uma nova geração de líderes na dança”. Com raízes na dança folclórica mexicana, Molinar cresceu entendendo a dança como parte integral da cultura, resiliência e sobrevivência de seu povo.
Autointitulada uma “ativista administrativa das artes”, Molinar usa a dança contemporânea para tornar o cenário artístico de Boston mais acolhedor para jovens talentos e uma carreira mais sustentável a longo prazo. O programa oferece treinamento técnico e desenvolvimento profissional, com workshops que abordam o racismo na dança e mentorias específicas para artistas não-brancos. “Acredito que não se pode fazer dança contemporânea sem estar desperto para o momento atual”, afirma ela. “Por sua própria natureza, a dança contemporânea precisa incluir alguma forma de ativismo”.
Conexões Inesperadas e um Propósito Comum
A trajetória de Molinar não se limita às artes. Antes de se dedicar integralmente à dança, ela foi ecologista, formada pela Brown University, onde pesquisou a contaminação por metais pesados na água da chuva. Embora tenha deixado a ciência, ela trouxe os conceitos para sua nova carreira.
Ela usa termos da ecologia para descrever sua filosofia. Um exemplo é o conceito de “espécies-chave”, que são organismos que têm um impacto desproporcionalmente grande em seu ecossistema. “Os elefantes, por exemplo, impactam seu ambiente simplesmente por serem elefantes: eles comem muito e dispersam sementes por toda parte”, explica. Para ela, os dançarinos podem ser essas espécies-chave, capazes de gerar grandes transformações em suas comunidades.
Seja através da celebração da cultura afro-brasileira em rede nacional, como faz Zebrinha, ou da fusão entre dança contemporânea, ecologia e ativismo, como faz Molinar, ambos os artistas demonstram que o movimento corporal é um veículo para mudanças profundas, moldando não apenas a arte, mas também a sociedade ao seu redor.